domingo, 7 de fevereiro de 2016

Reflexões acerca do currículo escolar no contexto atual

Introdução

Todo o cidadão brasileiro tem direito a educação segundo rege a Constituição Federal de 1988 aprovada em nosso país. Assim, os estudantes devem ter assegurada a sua formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais. A partir da década de 1990 muitos estudos foram realizados, trazendo reflexões importantes sobre o currículo escolar no cenário brasileiro.
De acordo com o Artigo 26 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996 “Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela”. Logo, é relevante que cada rede de ensino ou estabelecimento busque adequar seu currículo pautado nas necessidades dos alunos, considerando a base comum e a parte diversificada de acordo com as características regionais e locais, pois deve ser valorizado a relação escola e vida.

O currículo escolar no contexto atual brasileiro

Com o avanço científico e tecnológico a educação é primordial, visto que, prepara o sujeito para ser produtivo e útil à sociedade. Ademais, ela atua diretamente na formação da mentalidade da pessoa, construindo sua individualidade com princípios éticos para a realização pessoal e a obtenção de sucesso quando atuar no meio social. De acordo com Luck 2009, p. 16:

A sociedade atual, marcadamente orientada pela economia baseada no conhecimento e pela tecnologia da informática e da comunicação, apresenta intensa dinâmica social, relações e influências globalizadas que, ao mesmo tempo, constituem-se em oportunidades culturais estimulantes e interessantes a todas as pessoas e organizações, assim como desafios e exigências extraordinários. Nesse contexto, a educação se torna imprescindível como ação contínua e permanente, demandando das instituições que a promovem, a necessidade de reinventar-se e melhorar suas competências continuamente.

Com o sistema econômico vigente em nosso país, denominado de capitalismo, a sociedade brasileira está organizada com base na propriedade privada, no lucro, na exploração do ser humano e da natureza. Diante disso, a escola tem a necessidade de tornar o estudante em um sujeito competitivo e preparar para ele se adequar ao mercado de trabalho, repassando conhecimentos científicos básicos para que ele possa atuar neste meio social de forma bem sucedida. O capitalismo segue a lógica da subordinação da sociedade às leis do mercado, visando a lucratividade para o que se serve da eficiência, dos índices de produtividade e competividade. Nesse contexto, o mercado de trabalho exige cada vez mais profissionais capacitados tecnicamente para atender as necessidades da demanda da produção industrial e na prestação de serviços básicos ao ser humano.
Então, o modelo de ensino desenvolvido nas nossas escolas vai de encontro a esse propósito, as instituições de ensino estão cada vez mais formando indivíduos com conhecimentos técnicos com o objetivo maior de conquistarem um alto poder aquisitivo, e muita das vezes, desprezando valores morais e éticos. Porém, é evidente que a escola sozinha não tem o poder de mudar a conjuntura social, mas pode contribuir na formação de cidadãos que primam pela transformação da sociedade. Portanto, se faz necessário uma reflexão no currículo escolar para decidirmos que tipo de ser humano a escola deve tentar formar.
Na escola a educação é responsabilidade de todos, onde os trabalhos desempenhados deverão ser satisfatórios, buscando desenvolver a aprendizagem efetiva e significativa do aluno com compromisso, interesse e principalmente com a integração e atribuição de tarefas entre diferentes pessoas que fazem parte do ambiente escolar. De acordo com os PCN 1999, p. 29:

O currículo, enquanto instrumentação da cidadania democrática, deve contemplar conteúdos e estratégias de aprendizagem que capacitem o ser humano para a realização de atividades nos três domínios da ação humana: a vida em sociedade, a atividade produtiva e a experiência subjetiva, visando à integração de homens e mulheres no tríplice universo das relações políticas, do trabalho e da simbolização subjetiva.

A estrutura curricular precisa ser adequada aos objetivos propostos, de modo que a seleção dos conteúdos que serão objeto de trabalho atenda as especificidades dos alunos. É interessante mencionarmos que vivemos em um país de muita desigualdade econômica, injustiça social e possuímos a diversidade de gênero, etnia e raça. Desse modo, a escola tem como função capacitar o aluno para atuar no meio social, respeitando as diferenças para contribuir para um mundo melhor.  Moreira 2007, p. 18 possui a concepção de currículo como, “as experiências escolares que se desdobram em torno do conhecimento, em meio a relações sociais, e que contribuem para a construção das identidades de nossos/as estudantes. Currículo associa-se assim, ao conjunto de esforços pedagógicos desenvolvidos com intenções educativas”.
Por exemplo, na Escola Estadual Vicente de Fontes, instituição em que trabalhamos, cada professor do Ensino Médio desenvolveu sua proposta curricular de acordo com a sua disciplina, obedecendo a legislação brasileira e atendendo as necessidades regionais e locais. Vejamos a figura 1, que trata de uma mandala construída pelos professores da mencionada escola que abrange os conhecimentos que deverão ser repassados para os estudantes.

Figura 1: Mandala abrangendo proposta curricular do Ensino Médio da Escola Estadual Vicente de Fontes
Com base no exposto, a proposta curricular da mencionada escola abrange saberes de caráter universal, nacional, regional e local, porque consideramos que a estrutura curricular, os conhecimentos escolares e os conhecimentos dos alunos devem ser objeto de reflexão crítica. Por isso, a organização curricular, além de conter os conteúdos/conhecimentos de determinado componente ou disciplina destinada a determinada fase da escolaridade precisa transitar pelos conhecimentos trazidos pelos alunos, como também incorporar os saberes da cultura local, sendo que os conteúdos e atividades artísticas devem ser organizados de forma integrada com todas as áreas do conhecimento.
De acordo com o Artigo 12 da Resolução nº 7, de 14 de dezembro de 2010:

Os conteúdos que compõem a base nacional comum e a parte diversificada têm origem nas disciplinas científicas, no desenvolvimento das linguagens, no mundo do trabalho, na cultura e na tecnologia, na produção artística, nas atividades desportivas e corporais, na área da saúde e ainda incorporam saberes como os que advêm das formas diversas de exercício da cidadania, dos movimentos sociais, da cultura escolar, da experiência docente, do cotidiano e dos alunos.

É interessante mencionarmos que o conhecimento escolar é uma construção específica da esfera educativa, sendo produzido pelo sistema escolar e pelo contexto social e econômico mais amplo. Segundo Moreira 2007, p. 22, “os conhecimentos escolares provêm de saberes e conhecimentos socialmente produzidos nos chamados âmbitos de referência dos currículos”. Por sua vez, estes correspondem as universidades e centros de pesquisa, ao mundo do trabalho, aos desenvolvimentos tecnológicos, às atividades desportivas e corporais, à produção artística, ao campo da saúde, as formas diversas de exercício da cidadania e aos movimentos sociais. Assim, com base na figura 1, observamos que a proposta curricular contempla esses saberes, visto que deseja trabalhar atividades interdisciplinares, desenvolver projetos e programas nas diversas áreas do conhecimento.
Nessa perspectiva, temos que considerar que mais do que o acúmulo de informações e conhecimentos, há que se incluir na proposta curricular um conjunto de conceitos e categorias básicas que contemple saberes integrados e significativos para que possibilite ao estudante o prosseguimento dos seus estudos para que ele possa compreender e atuar criticamente no mundo que está ao seu redor, fora das quatro paredes da escola.
A sociedade apresenta uma cultura heterogênea com relação a diversidade de gênero, etnia e raça. Atualmente, grupos pertencentes a sociedade que se sentem excluídos ou penalizados, como a mulher no mercado de trabalho, assim como, negros e homossexuais lutam por direito de igualdade. Segundo Moreira 2007, p. 19 “O currículo é o coração da escola, o espaço central em que todos atuamos, o que nos torna, nos diferentes níveis do processo educacional, responsáveis por sua elaboração”. Nesse sentido, os profissionais da educação devem assumir uma postura mais aceitável e flexível para a diversidade cultural. Logo, buscamos um currículo que possua sua estrutura voltado para a formação integral, que reconheça a multidimensionalidade da experiência humana, afetiva, ética, social, cultural e intelectual, tornando a instituição de ensino um espaço de produção de conhecimento e cultura, que conecta os interesses dos estudantes, os saberes comunitários e os conhecimentos acadêmicos para transformar o contexto socioambiental.
Nesse sentido, a proposta curricular de cada instituição de ensino deve ser elaborada considerando a formação básica comum, a parte diversificada, bem como as diferentes diretrizes curriculares nacionais. Ademais, deve se prevê a diversificação de atividades curriculares a fim de contemplar os diferentes sujeitos da aprendizagem. Deve também priorizar na educação básica temáticas de práticas pedagógicas relacionadas à alimentação e hábitos saudáveis de vida, valorizando por exemplo, a diversidade alimentar de espécies nativas e dos alimentos orgânicos.

Conclusão

A educação é o meio para a capacitação do indivíduo para conviver com as diferenças na sociedade, como também, para qualificá-lo para a produção e competitividade e inserção no mercado de trabalho. Ademais, o profissional da educação possui um papel importante na construção do currículo que se materializa na escola em nossas salas de aula. Logo, ele tem que participar crítica e criativamente na elaboração de propostas curriculares mais atraentes e mais democráticas. Ele precisa possuir uma postura de pesquisador, situando o seu aluno frente a problemas sociopolíticos, culturais e ambientais da sua localidade e do planeta, para que o educando possa atuar autonomamente. Então, o currículo deve se tornar em cada escola um espaço de pesquisa.
Dessa forma, a escola diante dos desafios da sociedade contemporânea deve provê formação cultural e científica que possibilite o contato dos estudantes com a cultura que deve ser provida pela ciência, pela técnica, pela linguagem, pela estética e pela ética. Ela deve fortalecer a luta contra a exclusão econômica, política, de etnia, gênero e sexualidade no intuito de contribuir para uma sociedade mais justa que ofereça oportunidade a todos os cidadãos.
Portanto, o currículo escolar atual não deve ser o mesmo proposto pela tradição escolar e conservado de igual maneira por todas as escolas, considerando como se os saberes fossem postos em gavetas distintas e transmitidos por meio de disciplinas trabalhadas de forma isolada. É significativo que em tempos de tecnologia e informatização o currículo escolar se forme a partir das necessidades de cada instituição de ensino e de cada aluno. Assim, ele passa a ser definido como sendo todas as situações vividas pelo educando dentro e fora da escola, seu cotidiano, suas relações sociais, as experiências de vida acumuladas ao longo de sua existência, as quais contribuem para sua carreira estudantil, e consequentemente para a formação de uma perspectiva construcionista educacional.
Podemos dizer então que o desenvolvimento do currículo na escola deve está articulado ao processo de configuração da identidade dos educandos e às dimensões da vida cidadã, a saber: saúde, sexualidade, pessoas com deficiência, trabalho, ciência e tecnologia, linguagens, respeito aos direitos humanos, aos valores democráticos e ao meio ambiente.

Referências

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: ensino médio. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Brasília: Ministério da Educação, 1999.

LDB. Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Lei nº 9.394, de 20.12.96. (1996).

LUCK, Heloísa. Dimensões de gestão escolar e suas competências. Curitiba: Editora Positivo, 2009.

MOREIRA, Antônio Flávio Barbosa. Indagações sobre currículo: currículo, conhecimento e cultura. [Antônio Flávio Barbosa Moreira, Vera Maria Candau]; organização do documento Jeanete Beauchamp, Sandra Denise Pagel, Aricélia Ribeiro do Nascimento. Brasília: Ministério da educação, Secretaria de Educação Básica, 2007.

RESOLUÇÃO Nº 7, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2010. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/rceb007_10.pdf>. Acesso em: 18 set. 2015. 

(Texto produzido por Rosamilton Lima. Atividade da Sala Ambiente Fundamentos do direito à Educação do Curso de Especialização em Gestão Escolar).

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